Eu que não sou de festejos carnavalescos e sempre desdenhei convictamente da importação recente do samba para os desfiles, desde logo por manifesta inadequação térmica, reforço a pior das impressões que tenho de quem se refere a estes parêntesis festivos, que entremeiam a mesmice do quotidiano, como sendo coisas menores. Pergunto-me com que linha avulsa desenham o mundo e a vida. Acresce que o Entrudo, pela sua natureza transgressora e em que o simulacro da máscara permite experiências que não têm lugar na vida "real", tem um papel lúdico compensador muito importante para as pessoas comuns, naturalmente acentuado em alturas de crise.
No simbolismo que representa desvalorizar a festa do Carnaval, coisa de gente mimada, [autêntica pieguice de quem não quer interromper as suas semanas agitadas com férias de inverno e férias de verão e com fins-de-semana retemperadores com uma escapadela a uma capital europeia ou a um spa bem estrelado], estoira com clareza o modo como as nossas vidas estão a ser transformadas num simulacro de vidas, comandadas por cabeçudos e gigantones insuflados de ar muito poluído.